domingo, 12 de setembro de 2010

Concreto Livre


Era uma cidade concreta e moderna - ou pelo menos era esta a pretensão. Impecáveis matemáticas eram a base de suas ideias arquitetônicas. Poder-se-ia dizer que cada candango inventava a sua própria catedral simbólica, em suas ambições, crenças e desejos. Considerava-me um candango, e é até engraçado dizê-lo. Vim à cidade em busca de uma nova vida. Como caminhoneiro, em meus apenas vinte anos, já conhecia o Brasil de cima à baixo, mas já pensava em quetar-me e quedar-me em um lugar.

Lembro-me especificamente bem de quando conheci Estella. Foi na inauguração da cidade. Na esplanada, bandas de rock ilustravam a modernidade. O céu de Brasília era promissor, e assim também eram as pessoas que ali inventavam uma cidade. Juscelino fazia seu discurso e eu, próximo a ele, fitava aquela multidão de candangos e políticos, até meus olhos encontrarem os dela. Tinha os cabelos desgrenhados, lábios cheios e olhos nordestinos. Era filha de alguém importante, isso eu podia dizer a primeira vista. Prendi aos olhos dela os meus, tornaram-se desimportantes as palavras de Juscelino, o sonho de Lúcio Costa e as belezas de Oscar Niemayer. Não me lembro o tempo que nos olhamos, pode ter sido alguns segundos ou horas a fio, mas foi tempo o suficiente para que passasse na minha cabeça a preocupação de com que dinheiro eu lhe compraria o anel.

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